Portal do Governo Brasileiro

O que é o TELELAB?

O TELELAB é um programa de educação permanente, do Ministério da Saúde, que disponibiliza CURSOS GRATUITOS, cujo público alvo são os profissionais da área de Saúde.

Certificação

Nossos cursos são certificados pela Universidade Federal de Santa Catarina. Clique aqui para saber mais sobre o processo de certificação.

Área do Aluno

Quarta, 01 Fevereiro 2017 00:00

Visibilidade para garantir direitos, saúde, respeito, cidadania e equidade à população trans

Avalie este item
(0 votos)

Diretora do DIAHV defende visibilidade trans em artigo publicado em agência aids de notícias

Por Adele Benzaken*

26/01/2017 - “A igreja aceita-te como tu és”, disse há dois anos o Papa Francisco – surpreendendo o mundo –, ao receber no Vaticano, a seu convite, a visita do transexual espanhol Diego Lejarraga e de sua namorada, Macarena. Com esse gesto, Jorge Bergoglio sinalizou a inclusão, pela Igreja Católica – radicalmente contrária às mudanças de sexo –, dessa população ainda muito excluída. O gesto é de forte simbolismo e efeito político para a sociedade contemporânea, porque é incontestável que cada pessoa tem o direito de ter a escolha da sua identidade de gênero respeitada.  
Por essa razão, somos convidados a participar da crescente discussão global em torno da identidade de gênero e da liberdade individual de escolhê-la. A hora é oportuna: globalmente, a população trans vem sofrendo pressões de toda ordem – entre agruras que vão desde a violência e discriminação à alta prevalência de HIV/aids.  
Segundo uma pesquisa recente da organização não governamental Transgender Europe (TGEU) – rede europeia de organizações que apoiam os direitos da população transgênero –, o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo: entre janeiro de 2008 e março de 2014, por exemplo, foram registradas aqui 604 mortes em razão da transfobia (EBC, 2015).  
Também de acordo com o II Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil, produzido pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República em 2012, 4.851 pessoas foram vítimas de violações relacionadas à população LGBT, tendo sido registradas 3.084 denúncias (BRASIL, 2012).

Além disso, estudo realizado por pesquisadores da Universidade Estadual do Piauí (Uespi) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) – conduzido entre março de 2010 e julho de 2011, com 207 professores de 144 escolas de Medicina – apontou que questões como a orientação sexual e a identidade de gênero são pouco discutidas e estudadas durante a formação profissional (BRASIL, 2016).

E mais: na própria comunidade LGBT, o grupo formado por travestis, mulheres transexuais e homens trans é ainda o mais estigmatizado. Esse contexto de intensa transfobia acirra problemas já inerentes ao Sistema Único de Saúde (SUS) – resultando também no incremento da incidência de HIV/aids nessa população.

Estudo de abrangência nacional de HIV, sífilis e hepatite B e C entre travestis e transexuais está sendo realizado nos municípios de Belém/PA, Belo Horizonte/MG, Brasília/DF, Campo Grande/MS, Curitiba/PR, Fortaleza/CE, Manaus/AM, Porto Alegre/RS, Recife/PE, Rio de Janeiro/RJ, Salvador/BA e São Paulo/SP, com o apoio técnico e financeiro do Ministério da Saúde.

Espera-se, com isso, que no médio prazo o Brasil tenha dados atualizados sobre a população trans – contribuindo, assim, para a adequação de políticas públicas direcionadas a essas pessoas.

As ações de prevenção focalizadas em grupos que concentram maior carga de infecção pelo HIV vêm sendo continuamente ampliadas; um exemplo é o projeto Viva Melhor Sabendo, que consiste na testagem por pares utilizando teste rápido de fluido oral. No âmbito desse projeto, já foram testadas mais de 85 mil pessoas. Desse total, 5% pertenciam à população trans, e foi justamente nesse grupo que se encontrou a maior proporção de resultados reagentes para o HIV.

Os esforços do Ministério da Saúde para atender à população trans não são recentes. Instituído em 2004 pelo Movimento LGBT em 2004 no Congresso Nacional, por meio do Ministério da Saúde, o Dia da Visibilidade Trans é celebrado todo 29 de janeiro. A data simbólica tem como objetivo incrementar a visibilidade da população trans, promovendo o respeito a seus direitos. A luta que cerca o Dia da Visibilidade Trans é no sentido de envolver sempre mais pessoas – cotidianamente – na promoção dos direitos dessa população e de uma cultura de paz. Outra pauta inerente ao 29 de janeiro é a luta contra a epidemia de HIV/aids.

Em 2011, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Saúde Integral LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais), que considera a orientação sexual e a identidade de gênero como determinantes sociais da saúde e tem como objetivo eliminar as iniquidades e desigualdades em saúde.
As ações visam expandir o acesso dessa população à saúde pública e ampliar o processo transexualizador no SUS (cirurgias de mudança de sexo, retirada de mama, retirada de útero, plástica mamária reconstrutiva e extensão das pregas vocais para mudança da voz, além de terapia hormonal), bem como promover a inclusão dos campos “nome social”, “orientação sexual” e “identidade de gênero” na Ficha de Notificação de Violência no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), a exemplo do que já acontece nas fichas do Siclom e Siscel.

Em 2016, foi possível observar um aumento de 137% no número de notificações em relação ao ano anterior. No ano passado, as pessoas transexuais representavam 2,3% de todas as pessoas vivendo com HIV/aids em uso da terapia antirretroviral. No mesmo ano, o registro de pessoas trans iniciando o tratamento foi 860% maior do que em 2015.

Esse crescente número de dados sobre pessoas trans em sistemas de vigilância mostra uma melhoria gradual na qualidade da informação – o que poderia estar associado à aplicação dos instrumentos legais que permitem a inclusão do nome social das pessoas trans nos sistemas. Os resultados podem reforçar a ideia de que as mudanças estruturais permitem  iniciativa de autoinscrição nos formulários de cuidados. Quanto mais transgêneros forem registrados, mais dados representarão corretamente o cenário de epidemias.

A realização do processo transexualizador depende, inicialmente, de avaliação e acompanhamento ambulatorial com equipe multiprofissional, o que inclui consulta com psicólogos, por exemplo. Para que o(a) usuário(a) tenha acesso aos procedimentos ambulatoriais, é preciso ter, no mínimo, 18 anos. Já as cirurgias são realizadas somente a partir de 21 anos. Além disso, após o processo cirúrgico, o(a) paciente é acompanhado durante um ano pelas equipes.

Foi ainda incluído um campo no formulário para preenchimento de violência motivada por homofobia/lesfobofia/transfobia, a fim de dar visibilidade à violência sofrida pela população LGBT. Também se realizou curso de educação à distância sobre a política nacional.

Outra ação importante desenvolvida pelo Ministério da Saúde para ampliar o acesso dessa população ao SUS é o uso do nome social. Em 2012, o Sistema de Cadastramento de Usuários do SUS passou a permitir a impressão do Cartão SUS – identidade do cidadão no sistema público de saúde – somente com o nome social do(a) usuário(a). Esse direito é garantido por meio da Portaria nº 1.820/2009, a Carta de Direitos dos Usuários do SUS. Entretanto, ainda permanece o desafio de assegurar que todos os profissionais de saúde entendam que a prática precisa ser incorporada ao seu cotidiano.   

Este é, todavia, apenas o início do crescente compromisso brasileiro para com a população trans. Nossa preocupação deve ser – de forma cada vez mais intensa – a saúde integral, o atendimento humanizado e o respeito oferecido a travestis, mulheres transexuais e homens trans no Brasil. Que o dia 29 de janeiro nos relembre nosso compromisso com essa população.

* Adele Benzaken é diretora do Departamento das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS).

Referências:

EMPRESA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO (EBC). Agência Brasil. Com 600 mortes em seis anos, Brasil é o que mais mata travestis e transexuais, 2015. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-11/com-600-mortes-em-seis-anos-brasil-e-o-que-mais-mata-travestis-e>. Acesso em: 18 jan. 2016.

BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Direitos humanos. II Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil, 2012. Disponível em: <http://www.sdh.gov.br/assuntos/lgbt/pdf/relatorio-violencia-homofobica-ano-2012>. Acesso em: 18 jan. 2017.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portal da Saúde. Ministério lança campanha voltada à saúde da população trans. 2016. Disponível em: <http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/cidadao/principal/agencia-saude/21893-ministerio-lanca-campanha-voltada-a-saude-da-populacao-trans>. Acesso em: 18 jan. 2017.

Fonte: http://www.aids.gov.br/noticia/2017/visibilidade-para-garantir-direitos-saude-respeito-cidadania-e-equidade-populacao-trans